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Novo estudo identifica gene associado ao TDAH, oferecendo novas pistas sobre a neurodivergência

Pesquisadores descobrem potencial ligação entre o gene KDM5B e o transtorno, abrindo novas perspectivas para compreensão e tratamento

 

Pesquisadores da Universidade de Yale, da FMUSP (Faculdade de Medicina da USP) e outras instituições dos EUA e Canadá identificaram um gene associado ao desenvolvimento do transtorno do déficit de atenção com hiperatividade (TDAH): o KDM5B. Publicado na revista Nature Communications, o estudo descreve o KDM5B como um “gene de risco de alta confiabilidade”.

O TDAH, que afeta cerca de 5% das crianças segundo a OMS, se manifesta principalmente na infância e frequentemente persiste na vida adulta. Os sintomas incluem desatenção, hiperatividade e impulsividade. E como uma alteração no KDM5B provocaria o TDAH? Ainda não se sabe, explica o médico e pesquisador Luís Carlos Farhat, um dos brasileiros que assinam o artigo.

A enzima lisina demetilase 5B, produto do gene KDM5B, pode desempenhar um papel crucial na estabilidade do genoma e no reparo de DNA. Se o gene, por conta de alguma mutação ou deleção de uma base, deixar de exercer adequadamente essa função, isso poderia aumentar o risco do TDAH. Mas o mecanismo ainda precisa ser desvendado em pesquisas futuras.

Para se ter uma ideia do tamanho do desafio, o mesmo KDM5B também está ligado ao transtorno do espectro autista (TEA), a transtornos de desenvolvimento e a doenças cardíacas congênitas. Logo, fica na mesa a possibilidade de uma raiz genética comum às diversas condições, podendo ser parte da explicação de por que condições psiquiátricas frequentemente se sobrepõem, com pacientes apresentando mais de uma delas.

De todo modo, o achado é motivo de ânimo, explica Farhat, já que a relação entre o gene e o TDAH era até então desconhecida. Também foram identificados outros três genes candidatos: YLPM1, CTNND2 e GNB2L1, classificados como “de risco potencial”.

São genes ligados ao funcionamento do maquinário da expressão gênica, ao desenvolvimento embrionário e à sinalização celular, respectivamente. Descobrir potenciais associações dos genes ao surgimento de condições como o TDAH revela a ponta de um iceberg que encanta os pesquisadores. À época do desenvolvimento do estudo, Farhat estava no doutorado, apoiado pela Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), e era orientado por Guilherme Polanczyk, do setor de psiquiatria da Criança e do Adolescente do Departamento de Psiquiatria da FMUSP. Farhat defendeu sua tese em março e continua suas pesquisas na área, agora no pós-doutorado. Também integram o rol de autores brasileiros do estudo Monicke Lima e Carolina Cappi, também da psiquiatria da FMUSP.

Para chegar a essas conclusões, foi preciso construir o maior grupo de pessoas com TDAH acompanhado por um longo tempo e seus pais biológicos — 152 trios, entre eles 30 brasileiros — com diagnósticos para TDAH. Segundo Farhat, apesar de testes laboratoriais e de imagem não serem até o momento capazes de auxiliar no diagnóstico do TDAH, se os médicos tiverem um bom treinamento, é possível haver um excelente nível de concordância entre profissionais independentes em relação à presença do diagnóstico.

O processo para saber quais genes, entre os mais de 20 mil existentes, poderiam ser responsáveis pelo TDAH envolveu o sequenciamento de todo o exoma (fração do genoma composta de genes) tanto de trios com filhos com TDAH quanto sem a condição (e sem potenciais confundidores, como TEA e outras neurodivergências). Aí se contabilizava quais genes em cada grupo apresentavam variações, especificamente nos filhos. Ou seja, eram alterações “de novo”, que não existiam nos pais. Proporcionalmente, alterações no gene KDM5B (e, em menor grau, nos outros três) foram mais frequentes nos trios com filhos com TDAH.

“Nosso trabalho destaca a importância de estudar variações genéticas raras juntamente com variantes comuns. Está se tornando cada vez mais claro que, para compreender distúrbios complexos como o TDAH, precisamos considerar todo o espectro da variação genética e que alterações genéticas raras podem desempenhar um papel importante em distúrbios comuns”, comentam os pesquisadores autores do estudo em um portal do periódico científico.

Não há aplicabilidade clínica imediata para os achados, mas eles pavimentam o caminho adiante. O próximo passo, explica Farhat, é realizar análises com amostras ainda maiores, para que, com uma maior resolução estatística, sejam encontrados novos genes de risco, para se construir um panorama ainda mais fidedigno.

“O ideal é que tenhamos grupos com milhares de trios. Em autismo, por exemplo, já se identificaram 72 genes de risco em milhares de participantes. Se você for menos criterioso para determinar o que seria um ‘gene de risco’, esse número sobe para a casa das centenas. E, tão importante quanto o tamanho da amostra é o avanço tecnológico, que possibilita entender cada vez mais sobre o material genético. Esperamos que no futuro esse caminho leve a respostas capazes de efetivamente melhorar a vida dos pacientes”, afirma o pesquisador.

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