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Cientistas da UFRGS criticam proposta de canal entre Lagoa dos Patos e Atlântico

Pesquisadores alertam para riscos de salinização, erosão do solo e impacto sobre espécies

 

Cientistas do Instituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) e do Instituto de Biociências (IBIO) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) expressaram preocupação com a proposta de criação de um canal entre a Lagoa dos Patos e o Oceano Atlântico para escoar a água das cheias. A sugestão, confirmada pelo ministro da Casa Civil, Rui Costa, está sendo estudada pelo governo federal.

Luiz Malabarba, vice-diretor do IBIO, descreveu a proposta como “uma solução mágica” e alertou que a medida poderia ter três principais impactos: salinização da água, erosão do solo e ameaça às espécies que habitam o ecossistema local.

“A busca por uma solução mágica em um momento de crise não é apropriada. Abrir um canal pode ter impactos muito piores do que os que estamos vendo atualmente. Pode provocar uma mudança no sistema natural de uma lagoa que é extremamente importante”, disse Malabarba.

A proposta do governo seria abrir um canal de 20 km, mas ainda não há prazos ou custos estimados. Os comentários do IPH e do IBIO foram feitos antes de Rui Costa comentar sobre a possibilidade de estudo do tema. A Casa Civil foi contatada na terça e na quarta-feira, mas não houve retorno até a última atualização desta reportagem.

O IPH afirmou que a proposta poderia ter “efeitos negativos sobre o ambiente, a sociedade e a economia, afetando a navegabilidade e a produção agrícola” e que esse tipo de obra exigiria estudos detalhados. “Há que considerar que esse sistema teria elevados custos de implantação e manutenção, com operação complexa”, manifestou o IPH em nota.

Apesar do nome, a Lagoa dos Patos é uma laguna, por possuir ligação com o mar. Ela é a maior laguna da América Latina, com 265 km de comprimento e 60 km de largura em sua cota máxima. Segundo o ministro Rui Costa, o estudo vai buscar alternativas que não impliquem em danos adicionais ao meio ambiente – por exemplo, que não alterem a salinidade da lagoa com a entrada de mais água do oceano.

No entanto, o professor Malabarba afirma que a salinização da lagoa é um dos maiores riscos. A lagoa equilibra a água doce que corre dos rios e do Lago Guaíba com a água salgada que entra pelo canal de Rio Grande, no Sul do estado.

“Abrir outro canal na Lagoa dos Patos vai salinizar outras porções da laguna. Modificar esse fluxo de passagem de água doce e água salgada pode salinizar a parte norte, não podendo ser utilizada, por exemplo, na irrigação de arroz”, explica o pesquisador.

Outro risco é o assoreamento do canal de Rio Grande, principal acesso de navios de carga e cruzeiros de turismo no RS e um dos principais portos do Brasil. Isso significa que pode diminuir a passagem de água no local, que ficaria com areia acumulada.

“Se nós abrirmos um canal, nós podemos proporcionar o assoreamento do canal de Rio Grande. Seria a deposição de sedimento, de areia, e tornar o canal não navegável”, explica Luiz Malabarba.

Outro impacto seria na vida de espécies da região. O professor do Institito de Biociências lembra que camarões, bagres, tainhas e corvinas vivem tanto no mar quanto na lagoa, se reproduzindo e se alimentando em ambos os ecossistemas. Centenas de famílias de pescadores dependem dessa economia.

Construir um canal ou criar comportas afetaria essas espécies. “A lagoa é um ecossistema altamente produtivo, tem uma atividade pesqueira considerável. Essa pesca precisa dessa passagem livre. Esses canais têm que estar permanentemente abertos”, diz Luiz Malabarba.

Em nota, o IBIO afirma que “é essencial adotar soluções que integrem a natureza em seu núcleo. Isso significa preservar e restaurar ecossistemas naturais, como florestas, campos e banhados, que desempenham um papel vital na redução do risco e impacto de enchentes”.

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